O governo brasileiro segue em missão para destravar o acordo de livre comércio entre o
Mercosul e a União Europeia. No final de abril, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu com Pedro Sanchez, o premiê espanhol, e agora em junho, com o presidente da França, Emmanuel Macron. Se polidas as arestas e os papéis forem finalmente assinados, representarão o maior tratado desse tipo no mundo. Serão 32 países envolvidos, somando 780 milhões de habitantes e um Produto Interno Bruto combinado de US$ 20 trilhões.
O país ibérico é peça-chave no desenrolar de um emaranhado de fios com pontas soltas. A Espanha assumiu a liderança do bloco europeu no dia 1º. de julho e já deu sinalizações claras de que vai trabalhar pelo aperto de mãos entre as partes. O Brasil navega para, além de um protagonismo natural, imposto pelo poderio geográfico e potencial econômico: na terça-feira (4/7), o país assumiu a presidência pro tempore do Mercosul.
Já a França não está na mesma afinação. O principal entrave hoje com o país é ambiental. Com adeptos no parlamento europeu, os franceses olham com desconfiança a promessa brasileira de combater o desmatamento. Essa desconfiança é alimentada pelas lembranças dos números e rusgas de um passado recente. Mas não só isso. Há também a possibilidade de que a política ambiental volte a perder força daqui a quatro anos, com a volta de um governo menos alinhado à causa.
No Mercosul, o pé atrás tem a ver com uma cortina fosca, protecionista, pronta a se jogar sobre todo o complexo agroindustrial em forma de barreiras e tarifas sobre produtos. O alvo principal é a carne bovina, atrativa para nós que a vendemos e para eles, que a consomem sem os altos custos regionais, em raras áreas dedicadas ao gado. Outro ponto sensível, permitiria a participação dos europeus em licitações públicas dos países do lado de cá.
Junta-se a isso mais um tempero fora do tom: a carta europeia com novas exigências. A principal delas prevê punições aos países sul-americanos que não cumprirem metas ambientais do Acordo de Paris. Nas palavras de Lula, alterações inaceitáveis em um acordo que, lembre-se, já havia sido concluído em um distante 2019.
Os apertos de mão parecem mais distantes, mas se virarem fotos, representarão uma aprovação que será benéfica para todos. De acordo com o Itamaraty, os ganhos para a exportação brasileira podem chegar a US$ 100 bilhões em 2035, quando as tarifas de importação sobre 91% do intercâmbio comercial estarão zeradas.
Às claras, o que temos, é uma oportunidade de potencializar empresas, negócios edesenvolver o Brasil. Trata-se de um caminho sem volta, de uma conexão que vai contribuir para a geração de empregos, especialização de mão de obra, avanço tecnológico e menores preços. Para tanto, será preciso se adaptar a cenários desafiadores e de concorrência. É fundamental pensar na internacionalização de empresas, na capacidade de interagir com novos mundos e culturas.
Para além do livre comércio, a relação Mercosul-União Europeia tem efeitos colaterais que podem ser benéficos ao nosso continente e ao Brasil. Outros importantes parceiros, e aqui fica claro se tratar de China e Estados Unidos, terão que rever estratégias para balancear receitas e a influência sobre toda a América do Sul. Para se manter competitivas e atraentes, as principais potências econômicas do mundo terão que ceder.
Para sair do papel, o acordo de livre comércio precisará da assinatura de todos os países que compõem os dois blocos. As cartas estão com Brasil e Espanha, que terão que usá-las de forma inteligente e perspicaz para convencer vizinhos, principalmente a França, do que é claro: todos vão ganhar.
(*) Marcelo Vitali, diretor da How2Go
Fonte: comex